Revista
Metrópole do Correio Popular
a matéria
28/10/04
Foto:
Nerivelton Araújo/AAN
INTERNET - Nela navegam saci-pererê, curupira, boitatá,
boto cor-de-rosa e outros personagens do folclore brasileiro.
Enquanto o Halloween é cada vez mais comemorado no País,
o site dedicado às nossas tradições populares
corre o risco de desaparecer. Salvem a Jangada.
Leia...
Bruno Ribeiro / Correio Popular
INTERNET
- notícia chegou como uma bomba para os interessados no
folclore brasileiro: a revista digital Jangada Brasil (www.jangadabrasil.com.br)
corre o risco de desaparecer depois de cinco anos divulgando a
cultura popular via internet. A nota publicada na página
inicial do site gerou uma onda de solidariedade em outros endereços
de cultura espalhados pelo espaço cibernético.
Em
pouco tempo de vida, o Jangada Brasil tornou-se referência
para professores, estudantes e pesquisadores interessados em aprofundar
conhecimentos em nossos ritos e tradições. De 1998
até agosto de 2003, o site conseguiu armazenar mais de
três mil textos e arquivos de som para download, além
de imagens e partituras relativas ao folclore. Ironicamente, a
página pode sair do ar por um motivo que deveria deixar
feliz qualquer webmaster do mundo: excesso de visitas mensais.
Como
explica Cláudio Ribeiro, um dos criadores da página,
quanto maior o número de acessos registrados, maiores são
os recursos técnicos que a página exige para suportar
o tráfego de leitores diários. Com uma média
de 120 mil acessos mensais e sem patrocínio, a manutenção
da revista digital está quase inviável para a equipe
de cinco pessoas, amigos apaixonados pelo Brasil que se conheceram
pela internet. “A solução encontrada para
o problema foi parar de atualizá-lo, como fazíamos,
e deixar apenas os arquivos disponíveis, temporariamente.
Só assim pudemos evitar ou adiar o desaparecimento do site”,
diz.
Boi
Falô também está na rede
Para Fátima Arantes, webmaster do site Barão On
Line (www.bgol.
com.br), a internet é, além do livro, uma mídia
que tem dado atenção ao folclore brasileiro. É
também a que mais tem encontrado dificuldades de se manter
no ar por mais de três anos. “Trabalhamos por conta
própria, sem dinheiro para investir na estrutura do site
e em contratação de profissionais para a equipe.
O que nos mantém no ar é a teimosia e o reconhecimento
dos leitores, que escrevem e agradecem pelas informações
que eles não conseguem encontrar em outros meios de comunicação”,
acredita.
Em
sua página, voltada para a história e para o cotidiano
do distrito de Barão Geraldo, Fátima dedica textos
sobre lendas do lugar, como a do Boi Falô, já integrada
como data comemorativa no calendário dos festejos populares
da cidade. “A televisão prefere veicular a cultura
estrangeira; as universidades, geralmente, tornam seus arquivos
inacessíveis para a maior parte da população.
Acredito que a internet tem um papel fundamental na perpetuação
do folclore nacional”, afirma. “Se o Jangada Brasil
desaparecer, será uma perda grande para todos nós
que trabalhamos com cultura”.
Núcleo
espera por uma sede
Para o jornalista e publicitário Wilson Lima, membro do
Núcleo de Cultura Caipira, divulgar o folclore deveria
ser um dever dos meios de comunicação no Brasil.
“A mídia tem o poder de ajudar na afirmação
da identidade nacional de qualquer povo, mas, infelizmente, não
age assim”, diz. Para Lima, os personagens de Monteiro Lobato,
muitos deles baseados em lendas do folclore, são a prova
de que a cultura popular nativa teria, inclusive, apelo comercial
capaz de atrair patrocinadores. “É errado pensar
que não há público para músicas, filmes,
peças de teatro, livros e seriados de TV tipicamente brasileiros.
A quantidade recorde de acessos ao site Jangada Brasil desmente
essa idéia”, observa.
Como
publicitário, Lima procura usar imagens de símbolos
e manifestações folclóricas do Brasil nos
produtos. Como membro do Núcleo de Cultura Caipira ele
ajuda a manter um site voltado para a divulgação
das pesquisas e atividades do grupo, o www.violacaipira.com. “Resolvemos
parar de reclamar da falta de publicações sobre
cultura regional e fazer alguma coisa”, diz.
Hoje,
o Núcleo de Cultura Caipira tem um grande acervo de material
relativo ao folclore nacional mas, por falta de patrocínio,
não encontrou ainda uma sede própria para torná-lo
disponível para a população – o maior
objetivo do grupo. “Enquanto isso, vamos divulgando nosso
trabalho pela internet”, conta Lima.
O
Manifesto Sacizista
O músico Ivan Vilela, pesquisador e divulgador da cultura
regional, em Campinas, lamenta o possível desaparecimento
do Jangada Brasil: “Ficaremos órfãos”.
Na página inicial do site, a imagem de um saci triste é
a síntese do sentimento de todos os que insistem em nadar
contra a corrente e divulgar uma cultura cada vez mais desvalorizada.
Para Vilela, o saci também simboliza a alma do folclore
nacional.
Tanto
que acabou inspirando o Manifesto Sacizista, a ser veiculado dia
31 de outubro, Dia das Bruxas (o Halloween norte-americano), pela
Sociedade dos Observadores de Saci, grupo que se juntou para combater,
com humor, a invasão cultural estrangeira.
“Além
da identidade, a manutenção da cultura popular está
ligada à dignidade de um povo, principalmente nesses tempos
de globalização”, afirma Vilela. Para ele,
não faz sentido celebrar uma data estrangeira e esquecer
que temos também tradições tão ou
mais ricas. “Se não tomarmos cuidado, daqui a pouco
tempo o Dia das Bruxas será nossa festa máxima”,
alerta.
Vilela
acredita que a internet, meio de comunicação que
pode ser o símbolo da modernidade, tem sido o melhor meio
de divulgação das tradições folclóricas.
“Chega a ser contraditório que o folclore tenha de
se respaldar numa mídia virtual para chegar aos brasileiros,
quando sua afirmação poderia ser feita também
pelas grandes mídias, como a televisão. Mas não
vamos desistir. Se o Jangada Brasil desaparecer, nascerão
outros mais”, acredita.
Folclore
na rede
www.jangadabrasil.com.br
www.violacaipira.com
www.bgol.com.br